segunda-feira, 4 de março de 2013

REDUTO POLÍTICO DE RENAN,DEIXA PREFEITURA PARA VER JOGO DE FUTEBOL.


O casarão mais famoso de Murici (a 50 km de Maceió) ficou submerso na devastadora enchente de 2010 em Alagoas, mas, ao contrário da maioria dos vizinhos, sobreviveu para contar história.
Espaçoso, porém sem ostentação, é nele que também sobrevive um atendimento à moda antiga praticado pela família do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), que soma perto de duas décadas de domínio na cidade de 26 mil habitantes.
Editoria de Arte/Folhapress
As portas permanecem abertas 24 horas por dia --trancadas, só as dos quartos--, seguindo uma tradição do clã iniciada por dona Ivanilda e major Olavo, pais de Renan e seus seis irmãos.
Segundo vizinhos, diariamente ao menos 20 cidadãos passam por lá com pedidos ao prefeito Remi Calheiros, irmão mais novo do presidente do Senado, ou à primeira-dama Soraya, que também é secretária de Ação Social.
Aos 50 anos, Remi cumpre seu quarto mandato à frente do município. Dos onze vereadores eleitos, só um é de oposição. Renan Filho, filho de Renan, foi prefeito por seis anos entre a sequência de mandatos de Remi. Antes, em 1992, Olavo Calheiros, patriarca da família, também ocupou a prefeitura.
Às 9h30 de uma segunda-feira de fevereiro, mais de dez moradores aguardavam a sua vez no pátio da casa. Havia os sem moradia, os sem saúde, os sem emprego, os sem botijão de gás. O prefeito dormia, informaram à Folha.
"O camarada morre na prefeitura e eles não [me] aposentam", queixava-se Jessão, 91, mestre de obras a serviço do município desde 1962 e que esteve lá para tentar resolver sua aposentadoria.
André Paiva de Oliveira, 34, padre de Murici, diz que Remi "vai protelando" as reivindicações. Um assessor do prefeito afirma que os pedidos seguem para avaliação das secretarias municipais.
Cafés da manhã, almoços e jantares são oferecidos para quem bate na porta. Esporadicamente, prefeito e primeira-dama participam das refeições. Arroz, feijão, carne, macarrão e salada são servidos em um aposento contíguo ao pátio interno.
Carlos Guilherme, 29, afirma ter encontrado com Remi três vezes, sem ter solucionado seu problema. Busca uma inscrição para ir a uma das 2.800 casas construídas pelo governo federal na cidade.
Na semana passada, a Defensoria Pública entrou na Justiça com pedido de liminar para suspender a entrega dos imóveis, por suspeita de fraudes nos cadastros.
"Aqui, os principais empregos oferecidos, assim como os benefícios dos programas públicos, estão na mão da prefeitura. A distribuição do Bolsa Família é da Secretaria de Ação Social, comandada pela primeira-dama", afirma Marco Aurélio Cunha, presidente municipal do PT.
Em Murici, 84% da população recebe Bolsa Família.

Felix Lima/Folhapress
Pessoas aguardam atendimento no casarão da família Calheiros, que governa Murici (AL) há duas décadas
Pessoas aguardam atendimento no casarão da família Calheiros, que governa Murici (AL) há duas décadas
DIA DE JOGO
Outro tema controverso na terra dos Calheiros é a relação apaixonada do prefeito Remi e seu time de futebol.
O Murici Futebol Clube estreou no campeonato alagoano em 1999 (na primeira gestão do irmão de Renan), ganhou seu primeiro título em 2010 e atualmente é líder.
Geraldo Amorim, chefe de gabinete da prefeitura, é presidente do clube. Remi preside o conselho deliberativo.
Em dezembro de 2010, a Câmara aprovou projeto de lei do Executivo que prevê R$ 40 mil mensais como ajuda de custo ao clube. Remi diz que ela é menor e se resume a coisas como empréstimo de um ônibus para as viagens.
Na semana em que a Folha visitou a região, a equipe jogou fora de casa em dois dias úteis da semana, terça e quinta, às 15h15. Primeiro em Olho d´Água das Flores, a 300 km aproximadamente. Depois em Viçosa, a cerca de 100 km.
Nos dois jogos Remi esteve presente --nas noites anteriores, recebeu os jogadores em casa para jantar.
Nesses dias, não deu expediente. Na quinta, a prefeitura, que funciona oficialmente das 7h às 13h, estava às moscas -- nenhum dos oito secretários estava por lá.
No intervalo de Comercial de Viçosa X Murici, nas arquibancadas, Remi foi questionado pela Folha sobre a ausência do secretariado. Até com certo entusiasmo, disse: "em dia de jogo é assim!".

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